quarta-feira, 11 de maio de 2016

Baú das memórias

Quando se aproxima mais um aniversário de vida, sinto vontade de mergulhar no tal baú, onde guardo caixas e caixinhas...
Hoje felizmente, já consigo deitar a mão e tirar aquelas que desejo rever, sem que as outras se desorganizem e me deixem também desorganizada.
Hoje já as consigo abrir todas e até naquelas em que só encontrava motivos para lágrimas, hoje já encontro razões para sorrisos...
Começo sempre por lembrar o meu atribulado começo, aquele que muita gente acreditou que seria muito próximo do fim...
Já deixei de ter pena de mim porque a minha mãe esteve impedida de me cuidar nos primeiros tempos de vida e ninguém da família teve condições para o fazer.
Tinha tanta piedade daquela criança, quando me contavam que tinha ficado até aos quase aos 4 meses numa instituição, onde não era alimentada nem cuidada e de onde veio com a sentença de morte anunciada, só pele e osso... uns olhos enormes que queriam ver o mundo... e certamente um coraçãozinho cheio de medo a querer carinho e conforto...
Cheguei a chorar, quase me esquecendo que era de mim que se falava... 
Hoje ao invés dessa tristeza e mágoa, sinto uma felicidade imensa, porque essa criança resistiu e ficou por cá...
Isto faz-me acreditar em diversas coisas... 
Acredito que só acontece aquilo que tem que acontecer... Acredito que enquanto não cumprimos a missão que cá nos trouxe, não partimos de novo... Acredito que temos dentro de nós a força suficiente para vencer as dificuldades que nos surgem pelo caminho...
A minha mãezinha contava que Deus a tinha ouvido em suas preces e a tinha curado a tempo de me salvar... Chegava a falar em Milagre... 
Eu acredito que se temos que continuar, as forças do Universo virão até nós quando as nossas atingirem o limite ... 
Claro que não parti! Claro que resisti, ganhei força  e cresci, magrinha, mas forte, saudável... Feliz!
Recordo que sempre fui condoída... Ficava triste quando olhava para os pés descalços dos pedintes e muito contente quando a minha mãe ou avó, lhes davam alguma coisa do pouco que também nós tínhamos...
Lembro-me de uma vez me descalçar, andar descalça na rua para saber o que sentiam essas pessoas  e ficar ainda mais triste... 
Entristecia-me de na escola onde a minha mãe trabalhava, haver meninos que andavam descalços... Lembro-me que sentia uma dor por dentro e sorria para eles... Como se o meu sorriso de alguma forma atenuasse aquela dor que eu já tinha sentido nos meus próprios pés...
Corria, contrariando a vontade da minha avó, a beijar as crianças que passavam, algumas mesmo sujas e cheias de ranho... Para mim eram lindas... eram crianças... 
No estado de inocência, somos sábios... só vemos o lado de dentro... 
Tenho lembranças de tenra idade, da primeira casinha onde morei até aos 5 anos, das brincadeiras que lá fazia, de ser destemida e curiosa...
Quando passo por esta casinha, hoje já melhorada em relação aquele tempo, fico sempre uns instantes a observá-la e o meu coração enternece-se ... 
Recordo ainda a primeira boneca de trapos que a minha avó me fez... a bem dizer, não me lembro de como era, recordo mais a alegria que senti nesse dia e sempre que brincava com ela...
Brincava mais tempo sozinha, fantasiando um mundo só meu, onde era imensamente feliz, porque tinha tudo aquilo que precisava...


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