O amor chegou bem cedo ao meu coração!
Não falo do Amor propriamente dito, porque esse
sempre lá esteve.
Recordo-me de bem pequena correr a dar beijinhos aos bebés de
etnia cigana que passavam pela minha rua. A minha avó e a minha mãe não
queriam, porque eles estavam sujos, mas eu achava-os lindos e escapulia-me mal
se descuidavam.
Com o que sei hoje, acredito que nessa altura eu conseguia ver
a beleza interior.
Julgo que as crianças têm esse dom, que depois perdem porque
os adultos as condicionam, ou então simplesmente porque vão perdendo a sua
pureza...
Retomando o assunto do amor, claro que não me
escapei ao tal amor platónico da adolescência, aquele que bastava amar, mesmo
que a pessoa amada nem soubesse, como foi o caso...
Mas o grande amor veio depois, apesar desse
depois ter sido muito cedo mesmo... e veio pelo coração, pelo lado de dentro.
Não veio pelo olhar, porque antes dos meus olhos verem, já o coração sentia...
Veio pelas palavras que chegavam de bem longe, ditadas por um coração
amargurado por uma guerra.
Esse amor veio e ficou e foi vivido intensamente
durante cerca de 30 anos. A Vida/Deus decidiu cortar a linha do tempo e só me
restou vivê-lo espiritualmente.
Durante anos pensei que me bastasse viver assim,
amando apenas de forma espiritual aquele que de homem passara a Anjo. Aquele a
quem eu escrevia quase diariamente a contar da dor, da saudade e também da luta
pela sobrevivência, que cada vez ia ficando mais difícil de manter. Depois
ia-lhe contando das pequenas conquistas... De conseguir entrar no chuveiro sem
dor, de conseguir ir ver o mar sozinha, de comer este ou aquele prato sem que o
salgasse demais com as minhas lágrimas, da primeira vez que não chorei antes de
dormir, da primeira vez que não chorei revoltada e dorida por voltar a acordar... dos sucessos dos nossos filhos...
Tantas cartas... tantos textos... tantos dias...
tantos meses... tantos anos...
Estava viva, sem viver... vivia aos bocados,
enquanto trabalhava, porque adorava o meu trabalho... vivia aos soluços de
tempo... fingia que vivia, quando era preciso, mas quando estava sozinha,
sentindo-me só, restava-me o consolo de não precisar fingir...
A pouco e pouco e com muita ajuda, aprendi a
viver comigo mesma e estava decidida manter-me assim, dentro de mim, dando-me
aos outros em geral, mas a ninguém em particular.
Houve uma altura em que me baralhei, meti os pés
pelas mãos e vi sinais onde eram apenas ensinamentos que a Vida me queria dar.
Demorei a entendê-los, mas cheguei lá e resolvi
voltar ao trilho certo, o de seguir viagem comigo mesma.
Foi nesse trilho que algo de especial aconteceu!
Começou de forma semelhante à primeira vez, foram as palavras que me foram
abrindo o coração... que me foram fazendo reflectir que... quem sabe...
talvez... talvez ainda valesse a pena... será que ainda era tempo...
No meu caminho, encontrei uma pessoa que senti
ser especial, que me sacudiu e me encorajou para me abrir de novo à vida. Que
me fez ver que o passado nunca morre, fica para sempre no nosso coração, mas não
deixa de ser passado. Que me incitou a criar coragem e olhar para mim e
viver.
Fui-me convencendo e, devagarinho o meu coração
cresceu um pouco e arranjei um cantinho para esse homem especial que
simplesmente, por uma série de acasos, chegou até mim.
Esse cantinho foi
crescendo e eu fiquei ansiosa, cheia de medo, cheia de dúvidas e sem coragem
para aceitar o que estava a acontecer.
Para quem julgava que só se ama de verdade uma vez na vida, tudo ficou em causa...
Não foi fácil aceitar que voltara a amar
outro homem, sem que tivesse que travar uma grande luta interior. Não foi fácil
vencer um sentimento de traição para com o único homem que amara. O que me
convenceu, foi a certeza de que quem ama quer ver o outro feliz, esteja em que dimensão estiver.
Depois da luta para assumir perante mim mesma,
veio a luta para assumir perante aqueles que são especiais para mim, era grande o medo de os magoar... e depois a
coragem para assumir para fora.
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